quinta-feira, 17 de julho de 2014

XIII EXAME DA ORDEM - PROVA COMENTADA - Comentários às questões de Direito Civil

Prezados,

Para auxiliá-los nos estudos, posto as questões objetivas comentadas de direito civil do XIII Exame da Ordem.

Na ordem (gabarito em negrito):

Questão 37 Pedro, menor impúbere, e sem o consentimento de seu representante legal, celebrou contrato de mútuo com Marcos, tendo este lhe entregue a quantia de R$400,00, a fim de que pudesse comprar uma bicicleta.  A respeito desse caso, assinale a afirmativa incorreta.
 A) O mútuo poderá ser reavido somente se o representante legal de Pedro ratificar o contrato.
B) Se o contrato tivesse por fim suprir despesas com a própria manutenção, o mútuo poderia ser reavido, ainda que ausente ao ato o representante legal de Pedro.
C) Se Pedro tiver bens obtidos com o seu trabalho, o mútuo poderá ser reavido, ainda que contraído sem o consentimento do seu representante legal.
D) O mútuo também poderia ser reavido caso Pedro tivesse obtido o empréstimo maliciosamente.
Justificativa: Note que o enunciado exige que o candidato assinale a opção incorreta. A letra “A” está errada porque contraria o disposto nos artigos 588 c/c 589, Código Civil:

Art. 588. O mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores.
Art. 589. Cessa a disposição do artigo antecedente:
I - se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente;
II - se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais;
III - se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução do credor não lhes poderá ultrapassar as forças;
IV - se o empréstimo reverteu em benefício do menor;
V - se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.

As demais opções estão corretas porque se enquadram no art. 589, CC.

Questão 38 A transmissibilidade de obrigações pode ser realizada por meio do ato denominado cessão, por meio da qual o credor transfere seus direitos na relação obrigacional a outrem, fazendo surgir as figuras jurídicas do cedente e do cessionário. Constituída essa nova relação obrigacional, é correto afirmar que

A) os acessórios da obrigação principal são abrangidos na cessão de crédito, salvo disposição em contrário.
B) o cedente responde pela solvência do devedor, não se admitindo disposição em contrário.
C) a transmissão de um crédito que não tenha sido celebrada única e exclusivamente por instrumento público é ineficaz em relação a terceiros.
D) o devedor não pode opor ao cessionário as exceções que tinha contra o cedente no momento em que veio a ter conhecimento da cessão.

Justificativa:

A letra “A” corresponde exatamente ao preceituado no art. 287, Código Civil: “Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios.”

A letra “B” contraria o art. 296, CC: “Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.”

Já a letra “C” ofende o estatuído no art. Art. 288, CC: “É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1o do art. 654.”

Por fim, a opção “D” contraria o art. 294, CC: “O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente.”


Questão 39 Lúcia, pessoa doente, idosa, com baixo grau de escolaridade, foi obrigada a celebrar contrato particular de assunção de dívida com o Banco FDC S.A., reconhecendo e confessando dívidas firmadas pelo seu marido, esse já falecido, e que não deixara bens ou patrimônio a inventariar. O gerente do banco ameaçou Lúcia de não efetuar o pagamento da pensão deixada pelo seu falecido marido, caso não fosse assinado o contrato de assunção de dívida. Considerando a hipótese acima e as regras de Direito Civil, assinale a afirmativa correta.

A) O contrato particular de assunção de dívida assinado por Lúcia é anulável por erro substancial, pois Lúcia manifestou sua vontade de forma distorcida da realidade, por entendimento equivocado do negócio praticado.
B) O ato negocial celebrado entre Lúcia e o Banco FDC S.A. é anulável por vício de consentimento, em razão de conduta dolosa praticada pelo banco, que ardilosamente falseou a realidade e forjou uma situação inexistente, induzindo Lúcia à prática do ato.
C) O instrumento particular firmado entre Lúcia e o Banco FDC S.A. pode ser anulado sob fundamento de lesão, uma vez que Lúcia assumiu obrigação excessiva sobre premente necessidade.
D) O negócio jurídico celebrado entre Lúcia e o Banco FDC S.A. é anulável pelo vício da coação, uma vez que a ameaça praticada pelo banco foi iminente e atual, grave, séria e determinante para a celebração da avença.


Justificativa:

A opção “A” não está correta visto que não houve erro substancial, pois Lúcia sabia estar assinando uma assunção de dívida e não outro negócio qualquer. Ele sabe do objeto e da natureza do negócio, bem como com quem está negociando. As hipóteses de erro substancial estão descritas no artigo 139, CC:
Art. 139. O erro é substancial quando:
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.


Da mesma forma, não se trata de dolo, que é o “induzimento a erro”. Vale a pena um esclarecimento: dizemos que houve erro, quando a parte contratante se equivoca sozinha, em uma impressão errada, sem que ninguém a tenha provocado; no entanto, afirmamos ter havido dolo, como vício de consentimento, quando uma parte induz a outra a erro. Mais uma vez, reiteramos que Lúcia não entendeu errado a realidade, nem foi induzida a entende-la da forma equivocada, por isso, não houve dolo também, não podendo ser resposta a letra “B”.

A lesão está descrita no art. 157, CC: “Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta” (grifos nossos). Note que não houve lesão na hipótese, porque não há prestação oposta (ou seja do banco, em oposição à obrigação assumida por Lúcia)! Em outras palavras: Lúcia assume uma obrigação, mas não há obrigação por parte do banco. Outro ponto a considerar: a opção C tenta criar certa confusão com outro instituto, o chamado estado de perigo, previsto no art. 156, CC: “Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.” Perceba que, no problema, Lúcia não realizou o negócio para salvar sua vida ou integridade física ou psicológica.

Sendo assim, resta apenas a opção “D”, referente à coação. Assim prevê o art. 151, CC:
“Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.” Lúcia temia dano a seus bens e, podemos dizer, à sua pessoa.

Questão 40 Felipe, atrasado para um compromisso profissional, guia seu veículo particular de passeio acima da velocidade permitida e, falando ao celular, desatento, não observa a sinalização de trânsito para redução da velocidade em razão da proximidade da creche Arca de Noé. Pedro, divorciado, pai de Júlia e Bruno, com cinco e sete anos de idade respectivamente, alunos da creche, atravessava a faixa de pedestres para buscar os filhos, quando é atropelado pelo carro de Felipe. Pedro fica gravemente ferido e vem a falecer, em decorrência das lesões, um mês depois. Maria, mãe de Júlia e Bruno, agora privados do sustento antes pago pelo genitor falecido, ajuíza demanda reparatória em face de Felipe, que está sendo processado no âmbito criminal por homicídio culposo no trânsito. Com base no caso em questão, assinale a opção correta.

A) Felipe indenizará as despesas comprovadamente gastas com o mês de internação para tratamento de Pedro, alimentos indenizatórios a Júlia e Bruno tendo em conta a duração provável da vida do genitor, sem excluir outras reparações, a exemplo das despesas com sepultamento e luto da família.
B) Felipe deverá indenizar as despesas efetuadas com a tentativa de restabelecimento da saúde de Pedro, sendo incabível a pretensão de alimentos para seus filhos, diante de ausência de previsão legal.
C) Felipe fora absolvido por falta de provas do delito de trânsito na esfera criminal e, como a responsabilidade civil e a criminal não são independentes, essa sentença fará coisa julgada no cível, inviabilizando a pretensão reparatória proposta por Maria.
D) Felipe, como a legislação civil prevê em caso de homicídio, deve arcar com as despesas do tratamento da vítima, seu funeral, luto da família, bem como dos alimentos aos dependentes enquanto viverem, excluindo-se quaisquer outras reparações.
Justificativa: A opção “A” está embasada no art. 948, CC:
Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.

O mesmo dispositivo demonstra a incorreção das opções “B” e “D”.

Já a letra “C” não pode ser a resposta em razão do que prevê o art. 935: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.” (grifos nossos)

Questão 41 Ary celebrou contrato de compra e venda de imóvel com Laurindo e, mesmo sem a devida declaração negativa de débitos condominiais, conseguiu registrar o bem em seu nome. Ocorre que, no mês seguinte à sua mudança, Ary foi surpreendido com a cobrança de três meses de cotas condominiais em atraso. Inconformado com a situação, Ary tentou, sem sucesso, entrar em contato com o vendedor, para que este arcasse com os mencionados valores. De acordo com as regras concernentes ao direito obrigacional, assinale a opção correta.

A) Perante o condomínio, Laurindo deverá arcar com o pagamento das cotas em atraso, pois cabe ao vendedor solver todos os débitos que gravem o imóvel até o momento da tradição, entregando-o livre e desembargado.
B) Perante o condomínio, Ary deverá arcar com o pagamento das cotas em atraso, pois se trata de obrigação subsidiária, já que o vendedor não foi encontrado, cabendo ação in
rem verso, quando este for localizado.
C) Perante o condomínio, Laurindo deverá arcar com o pagamento das cotas em atraso, pois se trata de obrigação com eficácia real, uma vez que Ary ainda não possui direito real sobre a coisa.
D) Perante o condomínio, Ary deverá arcar com o pagamento das cotas em atraso, pois se trata de obrigação propter rem, entendida como aquela que está a cargo daquele que possui o direito real sobre a coisa e, comprovadamente, imitido na posse do imóvel adquirido.
Justificativa: Esta é uma questão conceitual sobre obrigação propter rem, mas tem um fundamento legal também: “Art. 1.345. O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios.”

Pelo previsto neste artigo, já descartamos as letras “A” e “C”. A letra “B” resta descartada porquanto Ary tem responsabilidade principal e não subsidiária. A opção “D” é o gabarito, pois funda-se na natureza correta da obrigação, qual seja, propter rem, sendo aquela obrigação que onera o dono e possuidor de uma coisa.

Questão 42

Jeremias e Antônio moram cada um em uma margem do rio Tatuapé. Com o passar do tempo, as chuvas, as estiagens e a erosão do rio alteraram a área da propriedade de cada um. Dessa forma, Jeremias começou a se questionar sobre o tamanho atual de sua propriedade (se houve aquisição/diminuição), o que deixou Antônio enfurecido, pois nada havia feito para prejudicar Jeremias. Ao mesmo tempo, Antônio também começou a notar diferenças em seu terreno na margem do rio. Ambos questionam se não deveriam receber alguma indenização do outro.
Sobre a situação apresentada, assinale a afirmativa correta.
A) Trata-se de aquisição por aluvião, uma vez que corresponde a acréscimos trazidos pelo rio de forma sucessiva e imperceptível, não gerando indenização a ninguém.
B) Se for formada uma ilha no meio do rio Tatuapé, pertencerá ao proprietário do terreno de onde aquela porção de terra se deslocou.
C) Trata-se de aquisição por avulsão e cada proprietário adquirirá a terra trazida pelo rio mediante indenização do outro ou, se ninguém tiver reclamado, após o período de um ano.
D) Se o rio Tatuapé secar, adquirirá a propriedade da terra aquele que primeiro a tornar produtiva de alguma maneira, seja como moradia ou como área de trabalho.

Justificativa: A situação descrita enquadra-se perfeitamente na definição de aquisição por aluvião: “Art. 1.250. Os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização.

Confirma-se, assim, a opção “A” como gabarito.

A letra “B” não está correto, porque está em confronto com o previsto em:

Art. 1.249. As ilhas que se formarem em correntes comuns ou particulares pertencem aos proprietários ribeirinhos fronteiros, observadas as regras seguintes:
I - as que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos sobrevindos aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção de suas testadas, até a linha que dividir o álveo em duas partes iguais;

Não se trata de avulsão (opção C) porque não enquadra na definição do art. 1251, CC: “Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se indenizar o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver reclamado.” (grifos nossos)


Já a letra “D” está equivocada porque o terreno pertencerá aos moradores ribeirinhos: Art. 1.252. O álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das duas margens, sem que tenham indenização os donos dos terrenos por onde as águas abrirem novo curso, entendendo-se que os prédios marginais se estendem até o meio do álveo.

Questão 43
 Antônio, muito necessitado de dinheiro, decide empenhar uma vaca leiteira para iniciar um negócio, acreditando que, com o sucesso do empreendimento, terá o animal de volta o quanto antes. Sobre a hipótese de penhor apresentada, assinale a afirmativa correta.

A) Se a vaca leiteira morrer, ainda que por descuido do credor, Antônio poderá ter a dívida executada judicialmente pelo credor pignoratício.
B) As despesas advindas da alimentação e outras necessidades da vaca leiteira, devidamente justificadas, consistem em ônus do credor pignoratício, sendo vedada a retenção do animal para obrigar Antônio a indenizá-lo.
C) Se Antônio não quitar sua dívida com o credor pignoratício, o penhor estará automaticamente extinto e, declarada sua extinção, poder-se-á proceder à adjudicação judicial da vaca leiteira.
D) Caso o credor pignoratício perceba que, devido a uma doença que subitamente atingiu a vaca leiteira, sua morte está próxima, o CC/02 permite a sua venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, situação que pode ser impedida por Antônio por meio da sua substituição.
Justificativa: Trata-se de penhor pecuário.

A letra “A” não poderia ser o gabarito em face da lógica desta garantia e também do que prevê o inciso I do art. 1435, CC:

Art. 1.435. O credor pignoratício é obrigado:
I - à custódia da coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida, até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade;


Se foi o credor que deu causa ao perecimento do bem dado em garantia, por óbvio que tal fato não poderia autorizar a execução da dívida imediatamente pela falta da garantia, o que só aconteceria, se o bem tivesse perecido sem sua culpa e o devedor, chamado a substituir a caução, tivesse se recusado a fazê-lo.

Por sua vez, a Letra “B” contraria o inciso II do art. 1433, CC:

Art. 1.433. O credor pignoratício tem direito:
[...]
II - à retenção dela, até que o indenizem das despesas devidamente justificadas, que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua;

 Na letra “C”, outro equívoco. Se o devedor não cumpre a obrigação, o penhor ganha importância, porque permitirá ao credor a execução do bem com preferência perante outros credores deste mesmo devedor. Portanto, o penhor só se extinguirá com o pagamento da dívida ou adjudicação do bem.

O gabarito, opção “D”, tem como fundamento o previsto no inciso IV, art. 1433, CC:

Art. 1.433. O credor pignoratício tem direito:
[...]


VI - a promover a venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, devendo o preço ser depositado. O dono da coisa empenhada pode impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo outra garantia real idônea.

Bons estudos!

Havendo dúvida, pergunte nos comentários!

Alice Soares

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário!

Quem sou eu

André Luiz Monsores de Assumpção é matemático, educador, professor universitário e escritor. Mestre em Educação Matemática. Foi Coordenador dos cursos de Licenciatura em Matemática e Licenciatura em Pedagogia, Pro-Reitor de Graduação do Centro Universitário, Diretor Geral de IES e Gerente Acadêmico. Consultor educacional. Alice Soares Monsores de Assumpção é advogada, professora universitária e de cursos preparatórios para concursos, graduação e pós-graduação, assessora legislativa e consultora. Mediadora Judicial. Mestre em direito pela UERJ.